Local : casa da Angela Banhos
Apresentadora: Thereza Christina Matos
Apresentadora: Thereza Christina Matos
Participantes: Advanir, Ana, Bia, Conceição, Eterna, Karla, Lara, Luciana, Luzimar, Marilena, Maria Célia, Marília, Regina , Rosete, Sylvia, Teresa Lírio, Thaís, Zezé
O Autor
Pascal
Mercier é o pseudônimo literário usado pelo filósofo Peter Bieri. Nasceu em
Berna em 1944 e até recentemente foi professor de Filosofia na Universidade de
Berlim.
Filho
da pequena burguesia, cedo decidiu que não queria para si o tipo de vida que os
homens da casa levavam. O determinismo do almoço às 12h30 imposto pela fábrica o
fez começar a refletir sobre a condição humana com apenas 12 anos, altura em
que iniciou a leitura da História das religiões. "Nunca mais almocei a
horas certas", afirma agora.
O seu percurso biográfico e profissional
revela-se todo ele marcado por rupturas e deslocamentos: aos dezenove anos
abandona a sua cidade natal, Berna, fugindo, como ele próprio explica, da
«estreiteza suíça» e da «estreiteza da família».
Estuda Filosofia, Estudos Ingleses e
Estudos Indianos em Londres e em Heidelberg; seguem-se anos de investigação em
Berkeley e Harvard, e depois passa a lecionar em diferentes universidades
alemãs, até se instalar em Berlim como professor da «Freie Universität» (Universidade
Livre).
Foi co-fundador da unidade de investigação
“Cognição e Cérebro”.
Eventualmente preocupado com a reação da
comunidade universitária , Peter Bieri esconde a sua identidade atrás de um
pseudônimo literário. Apenas em 1998, quando da publicação de O Afinador de
Pianosque se seguiu ao seu romance de estréia O Silêncio de Perlmann
(1995) é tornado público o verdadeiro nome do autor.
O ex-professor deixou Berna e vive
atualmente em Berlim.
ENTREVISTA (Isabel
Lucas)
Prefere ser tratado por Pascal, o pseudônimo, ou por Peter?
Peter.
Porque escolheu então outro nome para assinar ficção?
Porque no
início tive medo da rejeição. Ser professor de Filosofia numa universidade
alemã e começar a escrever romances é perigoso.
Porquê?
É considerado
qualquer coisa baixa, pouco respeitável. Deixa-se de ser sério do ponto de
vista acadêmico. Era como se a vida acadêmica não fosse suficiente para mim e
eu tivesse de fazer mais qualquer coisa e as sanções podem ser severas. Quando
se escreve um primeiro romance não estamos seguros de nós. Falta confiança,
tememos ser magoados facilmente com reações negativas e queremos proteger-nos.
Quis ver o que acontecia com o livro com uma certa distância. No segundo
romance achei que devia revelar a minha identidade, mas psicologicamente
falando, o nome Pascal passou a fazer parte de mim.
Este seu livro já vendeu mais de dois milhões de cópias no
mundo. Começa com um professor de filosofia que muda de vida fascinado com uma
mulher, com a sonoridade da música portuguesa. Foi a música da língua que o
levou a escrever Comboio Noturno para Lisboa?
Exatamente. No princípio fui motivado pelo som da língua, a
melodia das frases. Flaubert, quando escreveu Madame Bovary, enviou uma carta
importante a um amigo. Dizia que desejava não ter de ter um enredo e poder
escrever um livro sobre nada, mostrando apenas a melodia e a poesia das
palavras em francês. Quando li estas frases tive a sensação de que tinha
descoberto o veículo para desenvolver os meus tópicos filosóficos: a solidão, a
morte, a decepção, lealdade… É muito difícil escrever sobre estes tópicos. É preciso
uma certa musicalidade. Achei que eu, suíço, criado na cidade de Berna, não
conseguia ter estofo para fazer sair de mim as frases que saem da pena de
Amadeu de Prado. Eu era muito pequeno e insignificante. Não é coqueteria. A
solução era inventar uma personagem que pudesse dizer frases como aquelas e
essa pessoa foi Amadeu de Prado.
E porquê um português, escritor da resistência, para desenvolver
essas idéias?
Sim. Porque havia Pessoa, o som da língua que adoro e lamento
não ter tempo para a aprender a falar. E Lisboa como cidade que assenta
perfeitamente em “Mundus” . É uma cidade lenta, com ares de século XIX, tirando
os carros; um pouco decadente. Precisava ainda de um ditador para ter o tópico
político da resistência no livro. Para se ter uma movimento de resistência é
preciso haver um ditador e entre o ditador e aquele resistente queria que
houvesse um conflito do tipo pai e filho, tinha de ser um ditador especial, com
a imagem de paternidades. Não podia ser Franco, nem Hitler nem Mussolini. Salazar era um tipo diferente de homem.
Um intelectual, professor de economia, não era alguém que gostasse da brutalidade.
Claro que cometeu atos brutais, mas nada como Hitler. Portanto foi Pessoa, o
som da língua, Lisboa como cidade e o ditador certo. Tudo isto me levou a
Portugal e a Lisboa.
Fala muito do som da língua. A que soa a língua portuguesa?
É o shhhhhh, o ççççç (Pausa para pensar). É suave, terno,
sedativo, que não seduz facilmente. Consigo ouvir a melodia do português
durante todo o dia. Em minha casa tenho um canal de televisão português e
consigo ouvir aquilo durante horas, ainda que muitas vezes não perceba nada. É
como uma bela paisagem e entramos naquela paisagem e esquecemos tudo.
Lê português?
Leio. Não consigo
falar, mas sei ler. É fácil. Não é fácil é ouvir porque vocês engolem as
letras… E li o seu jornal (DN), que entra no meu livro (risos)
Também leu Pessoa em português?
Sim.
É o único escritor português que conheço realmente bem. Mas vou ler mais portugueses.
Li traduções de António Lobo Antunes. Parece-me um escritor excêntrico e
incrivelmente poético. Como Flaubert, gosta de escrever só para usar as
palavras. Não precisa de enredo. Está muito perto dos poetas. Como dizia o
Pessoa, a poesia é um canto sem música. Acho que a escrita de Lobo Antunes é
assim. Um canto sem música.
O livro está a ser adaptado ao cinema…
É uma experiência
terrível. Quero separar muito bem o livro do filme. Tenho muitas dúvidas de que
consigam fazer um filme deste livro, mas os direitos foram vendidos… Eles
mudaram as personagens, o enredo, a atmosfera, tudo…
Está mais próximo de “Mundus” ou de Prado?
De ambos. Sou uma pessoa muito aborrecida, vagarosa, que tem boa
memória, sou trabalhador, disciplinado. Aí sou “Mundus”. Por outro lado, sou
emotivo, rebelde, aventureiro, romântico, o Prado.
Se vivesse em Lisboa, que sítio escolhia?
Acho que no Bairro Alto, pelas ruas, as cores, a atmosfera. De
preferência numa sala da qual se visse a água. A água é tão importante quanto o
som ou os nomes.
Entrevista publicada a 26 de
Março de 2008 no Diário de Notícias
Crítica 1
Trem Noturno Para Lisboa / Tobias
Thiessen
Esse
livro é daqueles que realmente possuem a capacidade de fazer você refletir
sobre as questões contidas nele, mesmo tempos depois de ter terminado de lê-lo.
A digestão das palavras do livro fica sendo feita por muito tempo ainda na
tua cabeça.
Trem
Noturno para Lisboa conta a história de um professor de línguas antigas,
Raimundus Gregorius que através de situações inusitadas decide mudar de vida.
Podemos
acompanhar como e porque esse professor de grego, latim e hebraico que levava
uma vida pacata e pautada pela ordem em Berna, na Suíça, de repente, de uma
hora para outra, desiste de tudo e como se fosse um detetive vai atrás do
médico português Amadeu de Prado em Lisboa. Mundus se encanta com o livro
"Um ouvires das palavras" que o português supostamente escreveu e vai
em busca de mais sobre o autor. Nessa viagem até Lisboa e em busca do autor,
ele conhece diversas pessoas e essas acabam o ajudando de uma forma ou de
outra.
O
leitor, no processo de leitura do livro, é levado a ler o livro dentro do livro
e conhecer melhor esse angustiado português que por causa do seu pai virou
médico e que combateu a ditadura de seu país assolado por Salazar. Percebe-se
que tanto o professor suíço como o médico português são um alter-ego do
professor de filosofia Peter Bieris, escritor do livro.
Eu
particularmente gostei bastante de ler. Gosto da Europa e essa mistura de
estilo alemão com a realidade portuguesa tem muito a ver comigo. O livro se
conecta comigo, com a minha identidade e diversas questões que o livro provoca são
em certo sentido também as minhas questões pessoais.
Lógico
que o livro contém ressalvas, ou seja, fatos díficeis de se engolir. Como por exemplo: como o cara consegue em poucos dias,
sem nunca ter tido contato direto com a língua portuguesa traduzir facilmente o
livro dessa língua para o alemão? Mesmo o livro sendo cheio de questões
filosóficas obscuras ele segue adiante na tradução do livro de Amadeu sem
muitas dificuldades! E também, todos os personagens conseguem discutir temas
profundos em inglês ou francês, apesar de não ser a língua mãe das pessoas.
Como ele se entende tão bem com todas as pessoas com quem ele se encontra? Ou
como Raimundus tem acesso tão fácil ao ex-liceu de Amadeu e pode montar o seu
acampamento e o seu canto especial lá?
Mas como dizem por aí: so what?
Pelo
que percebi a ideia do autor, não é em primeiro plano apresentar a história de
Mundus, mas sim, apresentar os pensamentos de Amadeu. E é ele, Amadeu e não o
professor suíço, a personagem principal do livro e que nos traz às reflexões
que o livro se propõe.
Não
é um livro que se lê assim, sem mais nem menos, também não fornece muitas cenas
de suspense que te prendem e que te fazem avançar na leitura. Para se aproximar
do livro e do seu conceito é necessário uma certa abertura e um vontade
filosófica.
Ajuda,
se você assim como Mundus, está cansado da tua vida, do jeito como ela é e/ou
busca novos horizontes, nem que seja apenas na tua forma de pensar.
Em todos os casos, se você se interessou, recomendo a leitura.
Critica 2
Trem noturno para Lisboa
:: Adília Belotti ::
Aos 50, um pouco
antes, um pouco depois, você às vezes sente vontade de desvestir-se de si
mesmo, mergulhar num outro eu e cair na vida, de preferência em algum lugar do
lado avesso do planeta!
Pode surgir de repente. Pode ter sido alimentado em
segredo durante anos. Mas esse ímpeto, de alguma forma, parece fazer parte
dessa etapa do caminho.
Mas contra todas
as expectativas, é exatamente isso que decide fazer um dia Raymund Gregorius,
um erudito enrustido mais do que típico professor de línguas antigas num
colegio de Berna, na Alemanha, já nas primeiras linhas do romance Trem Noturno
para Lisboa, de Pascal Mercier, codinome de Peter Bieri, também um professor,
mas de Filosofia, e em Berlim.
A cena do encontro do professor cinquentão com
a moça desesperada no meio de uma ponte, numa manhã chuvosa e a frase casual em
português, cuja melodia dá o comando da extraordinária decisão, é tão plausível
na sua absoluta impossibilidade que 'tomar o trem noturno para Lisboa' virou
expressão comum em Portugal para designar esses momentos de
"virada'.
Gregorius vai a Lisboa e mergulha literalmente na história de
um outro, o médico português, Amadeu de Prado. Percorre as ruas e visita os
lugares, encantado pela língua estrangeira e suas modulações afetivas, saudosas
de um não sei o quê.
O livro não é
novo, novidade é uma obra tão apoiada nas acrobacias do discurso ter vendido
mais de 2 milhões de exemplares no mundo! As belas palavras são sereias.
Lembro do poema
Ode Marítima, de Fernando Pessoa:
Ah, seja como for, seja para onde for,
partir!
Largar por aí fora, pelas ondas, pelo perigo, pelo mar,
Ir para Longe,
ir para Fora, para a Distância Abstrata,
Indefinidamente, pelas noites
misteriosas e fundas,
Levado, como a poeira, pelos ventos, pelos vendavais!
Ir,
ir, ir, ir de vez!
Todo o meu sangue raiva por asas!
Todo o meu corpo atira-se
pra frente!
Galgo pela minha imaginação fora em torrentes!
Atropelo-me, rujo,
precipito-me!.
Estoiram em espuma as minhas ânsias
E a minha carne é uma onda
dando de encontro a rochedos!
Fiz certa vez um
curso sobre "A Morte e o Morrer". Numa das palestras, a enfermeira
insistia que é impossível morrer bem sem um acerto final de contas com a vida.
Felizes os que conseguem partir com a sensação de "valeu!". Partir é um chamamento
poderoso demais para a gente fingir que não ouve: "Ir para Fora, ir para
Longe, ir para a Distância Abstrata", assim mesmo, com as maiúsculas a
sugerirem distâncias impossíveis de transpor.
Não custa nada
abrir uma frestinha nas nossas bem organizadas defesas para deixar entrar a
aventura, novas melodias, horizontes apenas adivinhados. Nem que seu 'trem
noturno para Lisboa' seja uma passagem de ida e volta, num final de semana para
uma cidade qualquer, desde que você não conheça e, sem reservas, sem vouchers,
sem bagagem! Ou um ótimo livro para "galgar pela imaginação fora em
torrentes'!
Critica 3
Trem Noturno para
Lisboa - (Clube de Leitura Icaraí)
Dezesseis pessoas
a bordo. Alguns passageiros novos que trouxeram contribuições muito
interessantes. Outros passageiros retornaram após um longo período de ausência
do Clube. Antes do início das discussões, houve algumas ponderações sobre
participação virtual na escolha do livro do mês; que o período de um mês é
muito pouco para lermos um livro, tornando as leituras apressadas ou não dando
tempo para se ler a obra, e outras considerações bastante polêmicas. Cantamos,
então, parabéns para nossa leitora fundadora do Clube nos idos de 1998 e
começamos as discussões.
Embora
não podendo participar da reunião por ser um dos participantes virtuais de
nosso Clube, as contribuições do nosso leitor de Campinas foram muito citadas
na noite. O piano de Jorge, as variações de Goldberg, Estefânia, Maria João, os
estados novos português e brasileiro, a tortura em João Eça, o trem como uma
alegoria da vida, a intensa identificação de Gregorius e Amadeu, mesma idade
dos dois na momento da busca de Gregorius, embora em tempo diferente, mesmo mal
físico o “que pode ter sido resultado da profunda identificação”, a intenção de
ainda voltar em Salamanca, as línguas antigas e o português, um latim moderno
falado nas ruas que ofereceu ao protagonista a ponte para o despertar de sua
vida, o evento da ponte que colocou Gregorius diante da questão da finitude da
vida, a magia da chuva, da ponte, do encontro com a portuguesa misteriosa que
nunca mais reaparece, mas que muda sua vida, etc.
Nada como outros
pontos de vistas, de outros leitores, para nos ajudar a ler um livro e repensar
nossa interpretação, nos estimulando a refletir sobre nós mesmos antes de
concluir algo.
As primeiras
impressões da leitura do “Trem Noturno para Lisboa” não foram nada animadoras. Achava que o escritor
suíço, para se distanciar de sua problemática pessoal, teria projetado suas
questões em um personagem estrangeiro, no que essa palavra teria de mais remoto
para ele, um português atormentado contra o qual ele poderia se sentir bem
blindado para expor seu alter ego. E o narrador, meloso e mórbido ao mesmo
tempo, parecia-me ser daquelas pessoas que grudam na gente obsessivamente, que
tentam viver a nossa vida. Meio obsessivo, não?
Muita coisa me incomodou no livro: a
síndrome do protagonista que enfrenta qualquer oponente no jogo do xadrez, mas
acha ridículo enfrentar a vida quando se tem tanto a enfrentar em si mesmo. O
questionamento sobre como seriam as coisas se não fossem como são, de como
podemos ser aquilo que não fazemos, etc.
Houve um momento
da viagem em que, olhando pela janela, avistei “O Homem que Via o Trem Passar”
(Georges Simenon) e invejei sua posição. Em outro momento da viagem descobri,
enfim, por que não estava gostando do livro: eu me sentia perdendo a partida (o
autor nos faz sentir que viver pode ser como se jogássemos uma partida de
xadrez). Eu levava cheque-mate sobre cheque-mate, mas persisti na viagem,
resistindo às tentações, sem descer nas estações intermediárias, que descobri
também, depois, serem meras miragens, porque o trem nunca para nas estações.
Lembro-me de ter alegado em uma das minhas postagens que o autor era muito
cheio de arroubos, superlativos e adjetivos, mas... a viagem da vida não é
assim?
Por diversas vezes ameacei pular do trem, estrebuchei,
não parecia literatura aquela mania do autor de deixar tudo explicadinho. Houve
quem me incentivasse a pular, talvez sensíveis ao incômodo que o culto à
personalidade de um personagem que não conseguia superar seus complexos de
culpa me causava (será que tenho problema com isso?).
Segui
o conselho do próprio Amadeu que afirma que devemos buscar as desilusões,
continuei me iludindo que o livro poderia melhorar na próxima estação. Ou, quem
sabe, no fundo estivesse buscando a desilusão final da última página do
romance. O livro mexeu também com o meu lado comodista de sempre aceitar a
vontade que não é a minha, minha síndrome do “seja feita a sua vontade”. Ao
chegar ao fim dessa viagem devo reconhecer que o livro tem passagens geniais ao
lado de outras horríveis, como a vida em geral.
E afinal, a vida é o que vivemos ou o
que imaginamos viver? E parece, ela, a um jogo de xadrez?
Critica
4
Trem noturno
para Lisboa
Em
qualquer resenha sobre o livro Trem noturno para Lisboa é possível saber que se
trata da história de Gregorius, um professor de filologia de Berna que se
apaixona pela sonoridade da palavra “português” e parte, então, para uma viagem
rumo a Lisboa onde procura aprender essa nova língua.
Há
dias terminei a leitura deste livro e desde então fico me rebatendo, tentando
encontrar o que dizer sobre ele. O básico já foi dito em todos os lugares: se
trata da história de um homem que abandona sua vida regrada num liceu de Berna
e parte para o improvável em sua busca por uma nova língua.
O
que mais, então, pode ser dito? Certa vez, um amigo antigo me falou, em voz
baixa, que não se deve contar o seu poema favorito a ninguém. Seu poema
favorito é o seu maior segredo. O que dizer então do livro que te tirou o
conforto diário, te jogou na tempestade, arrancou as raízes calmas do
cotidiano?
Não,
eu não teria muito a dizer sobre Trem Noturno para Lisboa. A não ser que se é
fisgado pelo livro no momento exato em que Gregorius se apaixona pela
sonoridade da palavra “português” cantado pela voz de uma estrangeira
desconhecido numa ponte de Berna. E isso acontece nas primeiras dez páginas. Da
estrangeira que entregou essa bela palavra a Gregorius não sabemos mais nada,
só a devastação que ela causou na vida dele. Depois deste encontro, Gregorius
decide aprender português, vai até uma livraria e o livreiro lhe apresenta um
livro nesta língua, de um médico de um livro só, Amadeu Prado. Gregorius, já
apaixonado pela palavra português, se apaixona uma segunda vez por tudo aquilo
que é dito no livro daquele autor desconhecido. Num impulso, ele abadona sua
vida e parte para Lisboa, numa tentativa de conhecer esse médico que diz coisas
sublimes num idioma sublime.
O
livro nos leva, então, a conhecer diversos personagens. Adriana, Mariana,
Mélodie, João Eça, Silveira, Jorge, Cecília, Maria João, Estefânia, todos eles
acompanham, de algum modo, Gregorius em sua tentativa de conhecer a história de
Amadeu. Há uma semana terminei o livro e ainda me espanto com a
vivacidade de cada um desses personagens na minha memória. Ainda me assusto com
eles, com a profundidade com que são desenhados, é como se estivessem do outro
lado da sala, me observando enquanto vou desvendando aquilo que eles sabem
sobre Amadeu.
De
todos os personagens, no entanto, é Amadeu, o médico das palavras de ouro, quem
conduz toda a trama do livro. É por Amadeu que Gregorius modifica sua vida,
avança, tropeça, muda, por fim. O livro possuiu três tramas narrativas: o livro
de Amadeu, a língua portuguesa e o xadrez. Eles estão presentes em quase todas
as páginas. Os personagens transitam por esses lugares, as conversas versam
sobre os três temas. As escolhas são feitas a partir deles. As partidas de
xadrez aparecem como um descanso na trama pesada, um alívio para a fumaça que é
levantada em cada página. A língua portuguesa traz a beleza e a sonoridade da
história, as últimas letras comidas, o chiado no final das palavras. E o livro
de Amadeu, com seus questionamentos intermináveis, lança Gregorius e a nós,
leitores, num redemoinho de perguntas e sensações e descobertas que nos levam
quase ao torpor.
Entre
um e outro tema encontramos ainda resquícios da ditadura de Salazar, mãos
trêmulas após anos de tortura, desaparecidos, doentes, velhos moribundos,
estratégias de combate, resistência entremeados na memória de agora e na
memória de antes. Nenhuma página é escrita com ares de espetáculos, antes, cada
evento – o de agora e o de antes – é narrado por palavras exatas, tranquilas de
estarem no lugar exato onde deveriam, sem exagero nem excesso.
É
tudo que posso falar sobre Trem Noturno para Lisboa. Todo o resto ainda está
preso em mim, ou eu nele.
Esse
livro que deveria trazer na capa um aviso: “CUIDADO, PRECIPÍCIO!”.
Critica
5
Mirian
Leitão
Um livro para quem gosta de livros e
das palavras. É assim o "Trem Noturno para Lisboa" de Pascal Mercier,
na verdade o pseudônimo de Peter Bieri, professor de filosofia em Berlim.
Gregorius, um professor de linguas
clássicas que de repente se apaixona pelo português, é o personagem principal.
A paixão é pela sonoridade que está na própria palavra "português" e
decide abandonar trinta anos de vida previsível e sair de Berna tomando o trem
para Lisboa. Antes ele encontra um livro que conduz todo o livro, o de Amadeu
do Prado, autor desconhecido de um livro só. Ao refazer os passos do autor e
aprender português em Lisboa ele leva o leitor para vários mundos,
inquietações, dúvidas e transcendências.
Sem ser uma história de ação ou
suspense, o livro - ou os livros contidos nele - envolve completamente o leitor
com a força do inesperado. Tudo é previsível e de certa forma imprevisível;
tudo aconteceria naturalmente e é improvável. Depois de romper com a rotina que
o aprisionou a vida inteira como o professor exemplar, Gregorius pode fazer
qualquer coisa; sua vida absolutamente sem rotina o leva a peregrinar
pelos passos do autor admirado, enquanto ele vai analisando os trechos
reveladores e apaixonantes do livro de Amadeu. Assim ele oferece ao leitor
reflexões filosóficas e frases belíssimas.
Nos meus primeiros dias de férias
tenho me dedicado a escrever. O delicioso ato de escrever sem o imediatismo do
jornalismo. Nada contra o jornalismo, mas tenho me dedicado a fazer o inverso e
o mesmo ofício que me apaixona. À noite, para descansar, li o Trem Noturno para
Lisboa. Com Gregorius e Amadeu do Prado viajei conquistando também cada etapa
da descoberta. O fim deixa fios soltos no ar levantando ainda mais dúvidas. Um
livro, enfim, para quem gosta de pensar.
Publicado no Brasil pela Editora
Record, no mundo já vendeu dois milhões de exemplares.
CURIOSIDADES
1 - Variações Goldberg
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
As Variações Goldberg formam um conjunto
de variações para cravo compostas por Johann Sebastian Bach. Publicadas
inicialmente em 1741 como o quarto volume da série Clavier-Übung ("Prática do
Teclado") de Bach, a obra é considerada um dos mais importantes exemplos
da forma variação.
Depois da
exposição da ária no começo da peça,
surgem trinta variações seguidas pela repetição da ária.
As Variações
Goldberg eram tidas no passado como um exercício técnico árido e aborrecido.
Hoje, entretanto, o conteúdo e a abrangência emocional da obra tem sido
reconhecido e se tornou a peça favorita de muitos ouvintes de música
erudita. As Variações são largamente
executadas e gravadas e têm sido objeto de muitos artigos, livros e estudos
analíticos
A história da
criação das variações foi tirada da biografia de Bach escrita por Johann Nikolaus Forkel:
"(Quanto a essas variações), devemos agradecer à provocação do
ex-embaixador russo na corte eleitoral da Saxônia, o conde Hermann Karl von Keyserling, que
freqüentemente passava por Leipzig e que trouxe consigo o
já mencionado Goldberg para receber orientações musicais de Bach. O conde tinha
freqüentes acometimentos de doenças e ficava noites sem dormir. Em tais
ocasiões, Goldberg, que vivia em sua casa, tinha que passar a noite na
antecâmara para tocar para ele durante sua insônia. … Certa vez, o conde mencionou, na presença
de Bach, que ele gostaria de ter algumas obras para teclado para Goldberg
executar, que deveriam ser de caráter suave e algo vigoroso de modo que ele
pudesse ser um pouco consolado por elas em suas noites sem dormir. Bach
imaginou que a melhor maneira de atender a esse desejo seria por meio de
variações, cuja escrita ele considerava, até àquela data, uma tarefa ingrata
devido ao fundamento harmônico repetidamente semelhante. Mas, uma vez que a
essa época todos os seus trabalhos já eram padrões de arte, tais se tornaram,
em suas mãos, estas variações. Mesmo assim, ele produziu um único trabalho
desta espécie. Daí em diante, o conde sempre as chamava de "as suas"
variações. Ele nunca se cansou delas e, por um longo período, noites sem dormir
significavam: 'Caro Goldberg toque para mim uma de minhas variações'. Provavelmente
Bach nunca foi tão bem recompensado por seu trabalho quanto foi neste. O conde
o presenteou com um cálice de ouro com 100 luíses de ouro. Não obstante,
mesmo que o presente tivesse sido mil vezes maior, seu valor artístico nunca
teria sido pago."
Variações Goldberg e a “Divina Proporção”
Tese
de Mestrado prova que se pode identificar a Proporção Áurea ( a Divina Proporção )
Na cultura popular
As variações
Goldberg de Johann Sebastian Bach é uma das obras
mais conhecidas do compositor. Ocasionalmente aparecem em trabalhos da cultura
popular.
. No
contexto de uma cena particularmente aterrorizante de O Silêncio dos Inocentes,
o Dr. Hannibal Lecter está a ouvir
apaixonadamente uma gravação de Glenn Gould da ária com que começam e terminam as
variações.
•
A mesma música é
tocada nos créditos de abertura da seqüência do filme, Hannibal.
•
A ária foi tocada
no filme O Paciente Inglês (1996).
•
A estrutura do
filme "Trinta e Duas Curtas Metragens Sobre Glenn Gould" (1993) se baseou nas Variações Goldberg.
2 – Doença de Bechterev –
Espondilite Anquilosante – Espondiloartropatia seronegativa – Doença
inflamatória crônica dolorosa e progressiva que atinge as articulações da
coluna vertebral e, em especial , as inferiores( art. sacroilíacas e da região
lombar) – Fator genético : HAL B27
Figura acima : Caso
muito agressivo em evolução deixada livre , sem tratamento medicamentoso e
fisioterápico .O
prognóstico é bom se o programa de exercícios recomendado for iniciado
precocemente e os medicamentos tomados quando necessários. A rigidez vertebral
pode ser um problema, mas raramente é incapacitante.
3 - A Ditadura Salazarista em Portugal
Antônio de Oliveira Salazar foi a figura central do Estado Novo, ou
seja, do Salazarismo em Portugal. Salazar foi Ministro da Fazenda e em 1932
tornou-se primeiro Ministro de Portugal, função durante a qual sustentou o país
em regime ditatorial por 41 anos. Nesse período, Salazar adotou subitamente
medidas em relação à economia portuguesa, acrescendo os tributos e condensando
os gastos do Governo, com isso, suprimiu o saldo negativo financeiro existente
no Estado. Essas ações renderam a Salazar influência e poder, tanto que ele
conseguiu retirar dos militares a força que possuíam até aquele instante.
À frente
do Governo, Salazar implantou uma nova Constituição em 1933 que constituiu o
fim da Ditadura Militar e o começo da Ditadura Salazarista, essa atitude tinha
como finalidade a mudança dos poderes políticos portugueses, e assim foi feito.
Através da política salazarista observou-se quase de imediato a perda da liberdade
de expressão, do direito à greve e à restrição da ação de alguns órgãos de
poder, como a Assembléia Nacional. O poder do Presidente da República passou a
ser figurativo. Nesse contexto, a autoridade estava concentrada nas mãos do
Primeiro Ministro.
Algumas Características da Ditadura de Salazar:
• A exaltação do líder, que
está sempre certo nas tomadas de decisão;
• A existência de um só partido, a União
Nacional, partido do governo;
• A Repressão através da política da Polícia
Internacional de Defesa do Estado;
• A Censura aos meios de comunicação
social;
•
O Nacionalismo exacerbado;
• Criação
da Mocidade Portuguesa: organização juvenil criada em 1936 com o intuito de
orientar a juventude para os valores patrióticos e nacionalistas do Estado
Novo. Observando que a inscrição era obrigatória entre os sete e os quatorzes
anos;
• O
Resguardo dos valores morais e tradicionais;
• Retirada
de todo caráter reivindicatório dos trabalhadores através da política
corporativista;
• Publicação
do Ato Colonial, no qual as Colônias Portuguesas existentes faziam parte
integrante da Nação Portuguesa e por isso deveriam ser defendidas, civilizadas
e colonizadas.
• Política
econômica protecionista que tinha por fim a redução das importações e aumento
da produção do país e no investimento da construção de obras públicas.
O Salazarismo foi uma das mais longas ditaduras do século XX, inspiradas
no modelo fascista. Durante este período Portugal viveu na censura, repressão e
sob o poder autoritarista Salazarista. A ditadura chegou ao fim em 25 de Abril
de 1974, derrubada pela Revolução dos Cravos, forte manifestação
militar.
Por Lilian Maria Martins de Aguiar
4 – Fernando Pessoa –
(1988/1935 – 47 anos – cirrose hepática)
Ao contrário dos pseudônimos - vários nomes para uma
mesma personalidade - os heterônimos constituem várias pessoas que habitam um único poeta.
Cada um deles tem a sua própria biografia, sua temática poética singular e seu
estilo específico. É como se eus fragmentados e múltiplos explodissem dentro do
artista, gerando poesias totalmente diversas.
O próprio Fernando
Pessoa explicou os seus
heterônimos:
Por qualquer motivo temperamental que me não proponho
analisar, nem importa que analise, construí dentro de mim várias personagens
distintas entre si e de mim, personagens essas a que atribuí poemas vários que
não são como eu, nos meus sentimentos e idéias, os escreveria.
Assim têm estes
poemas de Caeiro, os de Ricardo Reis e os de Álvaro de
Campos que ser
considerados. Não há que buscar em quaisquer deles idéias ou sentimentos meus,
pois muitos deles exprimem idéias que não aceito, sentimentos que nunca tive.
Há simplesmente que os ler como estão, que é aliás como se deve ler.
Ricardo Reis (médico)
Álvaro de Campos (engenheiro)
Alberto Caeiro (camponês)
Bernardo Soares
(ajudante de guarda-livros)